Da Revolução Constitucionalista ao Incentivo à carreira na Magistratura paulista

A sementinha plantada no coração de uma criança que rendeu bons frutos

 

        Na cerimônia comemorativa ao 84º aniversário da Revolução Constitucionalista de 1932, realizada em 9 de julho deste ano em frente ao Obelisco Mausoléu aos Heróis no Ibirapuera, zona sul paulistana, o Corpo de Bombeiros transportou urnas contendo cinzas dos heróis do movimento e que foram conduzidas por cadetes da Academia de Polícia Militar do Barro Branco ao interior do monumento. Ouve-se muito falar nos estudantes Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, mortos durante o levante e cujas iniciais originaram a sigla MMDC – que hoje nomeia o prédio que abriga os gabinetes de trabalho dos desembargadores da Seção de Direito Público. Entretanto, há inúmeros anônimos que lutaram pelos seus ideais e deram suas vidas em prol de uma sociedade mais justa e democrática.

        Dentre as urnas dos heróis anônimos carregadas pelos cadetes estavam as de Maria Leocádia de Lima Menezes Camargo, Washington Menezes Camargo e Jefferson Menezes Camargo, familiares da juíza da 7ª Vara Cível do Foro Regional de Santana, Ana Carolina Della Latta Camargo Belmudes. No palanque, com os corações cheios de orgulho e saudade, familiares dos heróis ouviram a chamada simbólica dos nomes, a salva fúnebre executada pelo 3º Batalhão de Policiamento de Choque e o “Toque de Silêncio” por policial militar corneteiro, além da declamação da “Oração Ante a Última Trincheira”.

        Para muitos, são heróis anônimos, mas para a família “Menezes Carvalho”, e, principalmente, a juíza Ana Carolina, a Revolução de 32 é extremamente valiosa e foi a sementinha plantada que a incentivou a fazer carreira na Magistratura paulista. Tudo começou com sua bisavó paterna, Maria Leocádia – mulher de personalidade forte, pequena em tamanho, mas com uma coragem enorme. Foi ela a primeira a incentivar os filhos Washington (avô da magistrada) e seu tio-avô Jefferson a se alistar e a lutar pela democracia. Maria Leocádia marchou junto com filhos e trabalhou na retaguarda do Movimento Constitucionalista.

        Washington, um jovem de apenas 19 anos, lutou por São Paulo e por ideais democráticos que o acompanharam por toda a vida. “Meu avô não contava detalhes de batalha. Sempre que perguntado, ele de alguma forma mudava o rumo da conversa e nem mesmo os filhos conheceram histórias por ele vividas. O que temos é um capacete, um livro e poucas fotografias. Sabemos da bronquite adquirida na trincheira e da prisão que durou alguns dias”, recorda a juíza.

        Ana Carolina guarda na memória de infância um encontro dos heróis de 32 que aconteceu na casa do seu avô. Ela relembra os preparativos, que sua avó separou a melhor louça e a mesa foi decorada no maior capricho. Ana, ainda pequena (tinha cerca de 9 anos à época), observava tudo com atenção. Ela conta que ainda se lembra da ansiedade de sua avó e da felicidade de seu avô com o reencontro dos veteranos da Revolução. Chegado o dia, aqueles senhores foram até um local reservado e lá ficaram por algum tempo. Uma reunião de recordações na qual possivelmente se lembraram de passagens e segredos não compartilhados, nunca revelados pelo seu avô, mesmo com a insistência incansável e impertinente própria da infância daquela menina.

        Esgotadas as confissões, todos rumaram ao lar de Washington Menezes Camargo. “Eram todos já senhores, com certa idade, pele marcada e andar vagaroso, mas naquele momento traziam nos olhos um frescor e um brilho da juventude, traziam no peito o orgulho e os mesmos ideais. Havia uma certa inocência, um romantismo”, declara Ana Carolina.

        A menina se sentou no degrau da varanda, encantada com aqueles homens que não mostravam a fragilidade da idade e que, naquele momento, eram heróis. “Não esquecerei nunca desse dia, a sensação por mim vivida e que hoje consigo entender. Sem dúvida meu avô teve forte influência na escolha do meu caminho, mas, infelizmente, não me viu crescer, não me viu jurar cumprir a Constituição, mas parte dele estava comigo no Salão dos Passos Perdidos, no Palácio da Justiça, quando tomei posse como magistrada. Maria Leocádia Menezes Camargo, Washington Menezes Camargo e Jefferson Menezes Camargo são meus heróis particulares”, revela, emocionada, a juíza Ana Carolina Della Latta Camargo Belmudes.

        História – A Revolução Constitucionalista é considerada o maior movimento cívico da história de São Paulo. Foi uma luta armada entre julho e outubro de 1932, que tinha por objetivo a derrubada do Governo Provisório de Getúlio Vargas e a promulgação de uma nova Constituição. No total, foram 87 dias de combates, que totalizaram – oficialmente – 934 mortos, embora estimativas não oficiais reportem até 2.200 baixas.

 

        N.R.: texto originalmente publicado no DJE de 24/8/16.

 

        Comunicação Social TJSP – LV (texto) / DG e arquivo pessoal (fotos)
        
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